A chamada "geração sanduíche" compreende adultos, geralmente "prensados" entre as responsabilidades de cuidar dos seus pais (a lidar com os desafios do envelhecimento e por vezes com baixos recursos) e dos filhos, ainda dependentes (pela idade, porque a formação académica se prolonga, porque estão desempregados,...).
Esta situação é cada vez mais frequente nas sociedades modernas, devido ao aumento da expectativa de vida e ao facto das mulheres, por questões que se prendem com a formação académica e a carreira, optarem ser mães mais tarde.
O título de um artigo publicado no Observador, da autoria de Maria Catarina Antunes, em meu entender sintetiza, de forma perfeita, a situação: "Geração Sanduíche. Cuidar dos pais quando ainda se toma conta dos filhos".
Exemplos de tipologias da geração sanduíche:
Cuida de pais idosos e filhos menores.
Cuida de pais idosos e filhos adultos com necessidades especiais.
Cuida de pais idosos, filhos menores e cônjuge com problemas de saúde.
Cuida de pais idosos e um/vários filhos menores.
Cuida de pais idosos e de netos.
1. Situação em Portugal, na Europa e no Mundo:
Em Portugal:
Estima-se que existam cerca de 1,2 milhões de pessoas na geração sanduíche.
As mulheres são mais afetadas do que os homens, assumem, quase sempre, o papel de cuidadoras na família, que somam às suas responsabilidades familiares e profissionais.
As principais dificuldades são conciliar trabalho e cuidado com familiares, falta de tempo para si mesmas e sobrecarga mental, emocional e física.
Na Europa:
A geração sanduíche é um fenómeno crescente em toda a Europa.
Países com maior expectativa de vida e menor natalidade são mais afetados (há menos filhos para assumir o apoio partilhado aos pais - se bem que da minha experiência, a relação não seja tão direta assim... muitos filhos se demitem de o fazer, independentemente da sua condição financeira ou disponibilidade de tempo - por outros motivos) .
Existem políticas públicas que podem dar algum apoio - mas ainda há muito a ser feito, de forma direcionada para a situação concreta.
No Mundo:
A geração sanduíche é um problema global.
Países em desenvolvimento são particularmente afetados, devido à falta de infraestruturas e serviços de apoio (creches, apoio à pessoa idosa, desemprego, baixos salários ...).
A pandemia de COVID-19 agravou a situação da geração sanduíche em todo o mundo, com impacto negativo no seu bem-estar geral e mesmo na saúde mental.
2. "Dores", desejos, potencialidades e inconvenientes, alguns exemplos:
"Dores", ou seja, algumas consequências negativas de quem se sente" ensanduichado/a":
Stress
Ansiedade
Depressão
Exaustão mental, emocional e física.
Culpa e frustração: (dificuldade de conciliar o inconciliável: cuidar e trabalhar, cuidar de si e de outros, ... o cuidador tem frequentemente a sensação de ser insuficiente para as responsabilidades.... e culpa-se, sente-se frustrado, em falta).
Sensação de solidão, de insuficiência, ...
Desejos - o que gostariam de ver garantido:
Equilíbrio entre vida familiar, profissional e pessoal.
Tempo para si mesmas/os.
Mais apoio social e familiar.
Reconhecimento pelo seu papel , com impacto familiar e social, traduzido em apoios concretos.
Políticas públicas adequadas , de apoio de caráter transgeracional, para resposta ajustada à realidade.
Exemplos de potencialidades - desencadeadas pela urgência e permanência da resposta no tempo:
Resiliência
Força/coragem
Empatia
Criatividade
Capacidade de organização
Intergeracionalidade ( interações de pessoas com diferentes idades e em diferentes fases da vida).
Inconvenientes - pela sobrecarga e encargos associados:
Risco de doenças (ansiedade, depressão, tensão alta, stress constante, ....)
Dificuldades no trabalho e nos relacionamentos
Problemas financeiros
Abandono de sonhos e projetos pessoais
4. Outros Aspectos Relevantes:
Classe social: Pessoas socialmente mais desfavorecidas são mais afetadas pela geração sanduíche, devido à falta de recursos financeiros e sociais adequados (faltam creches no setor público, no verão algumas creches ou infantários fecham, ... Os apoios para as pessoas idosas são caros para a sua disponibilidade financeira. No interior, por exemplo, as baixas reformas ditam a necessidade dos filhos contribuírem para as despesas dos pais, se institucionalizados. A dificuldade é que alguns filhos também vivem em casa, desempregados, com empregos precários...
Profissão: Profissões com alto grau de exigência podem dificultar o cuidado com familiares, por exemplo, em cargos que exigem isenção de horário, cargos diretivos.
Apoios:
Saúde: Serviços de saúde mental, grupos de apoio, cuidadores profissionais que podem ser um recurso valioso para aliviar os cuidadores familiares.
Sociais: Programas de apoio à família, subsídios financeiros, creches e centros de dia para idosos, Estruturas Residenciais para pessoas Idosas (Lares), Serviços de Apoio Domiciliário (a necessitar de ser repensado para permitir implementar o conceito de "ageing in place"de forma segura.
Associações de doentes: Apoio e informação sobre doenças crónicas (Alzheimer Portugal, Associação Portuguesa da Doença de Parkinson, Liga Portuguesa Contra o Cancro, ...).
Considerações Finais:
Dado que, como mencionado antes, as mulheres, já de si sobrecarregadas com as responsabilidades no seio da família, são as mais atingidas, por serem, neste contexto, quem assume o exigente papel de cuidadora.
Títulos da imprensa, portuguesa e estrangeira, sobre o assunto, colocam no respetivo artigo palavras e expressões como mulheres sobrecarregadas", "esmagadas", "ensanduichadas", "desafiadas a lidar com a dura realidade"...
Basta estar vivo e olhar à volta para concordar. Mas, de uma forma ou doutra, toda a família é afetada por esta realidade, quando acontece. Há que procurar as melhores respostas - cada família é única - logo, as suas potencialidades e necessidades também.
(Talvez que esta realidade seja a sua... não desista de si. Cuide-se (Medicina convencional. Terapia. Outra via que escolha,...).É urgente manter/recuperar o seu equilíbrio. Por si e por eles).
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